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A luta dos enfermeiros.

Sempre disse que jamais poderia ser profissional de saúde. Que nunca conseguiria ser uma dessas pessoas, que todos os dias salvam dezenas de vidas, ou que contribuem na primeira pessoa para que a existência dos outros seja um bocadinho melhor,  menos sofrida, muitas vezes mais digna. E não. Não estou a falar dos médicos deste país. Estou a falar dos enfermeiros! Os enfermeiros que ganham tanto quanto eu, e que talvez trabalhem tanto quanto eu. Quanto nós. Que também nos queixamos de má remuneração, que também nos sentimos desvalorizados, que também vivemos no sufoco do excesso de trabalho. 

Contudo, o exercício que vos proponho é simples.  Pensem por breves instantes naquilo que acontece quando erram na vossa profissão. Quando põem a pata na poça, quando acidentalmente são negligentes ou menos rigorosos no desempenho das vossas tarefas... é aí que mora a grande diferença.

Por mim falo! No meu caso, posso dizer que o meu erro pode gerar  um “negro” televisivo. Um mau momento, do qual passados alguns dias já ninguém se lembra. Pode valer-me uma valente “rebocada” e em última instância conduzir a uma perda monetária por parte da empresa. Chato? Muito. 

Mas será que poderia morrer alguém? Não. Será que a qualidade de vida de terceiros poderia ficar irremediavelmente comprometida? Também não. Então, talvez o volume de trabalho e o número de horas que dedicamos ao cumprimento das nossas tarefas sejam um barómetro falsioso. Um termo de comparação que teima em misturar o "cu e as calças" (perdoem-me a expressão) e em colocar todas as profissões no mesmo saco. 

 

Não sou enfermeira, como sabem, mas tenho muitos amigos e familiares que o são. Todos os dias, muitas horas por dia.  Por noite.  São-no dentro e fora do hospital, nas horas de trabalho e depois delas. Antes delas, quando os turnos começam na hora que vamos dormir. 

E também aqui me podem dizer que há um milhão de outras profissões que têm horários difíceis, que vivem "de turno em turno". Lá está... haverão sempre “as vozes de fundo”. As mesmas que se abafam quando precisam dirigir-se à urgência. Quando estão acamadas e dependentes. Quando a saúde lhes é roubada e fica entregue às mãos dos enfermeiros, mais do que dos médicos, acreditem. 

 

São os enfermeiros que fazer "mexer" os hospitais, e são também eles que quando estão em greve os impedem de funcionar devidamente. Mas é preciso que aconteça. É preciso que as cirurgias e as consultas deixem de acontecer, que as filas e as horas de espera se multipliquem... é preciso que deixemos de apontar o dedo , alegando que "eles estão em grave mas que quem paga somos nós". 

A remuneração da enfermagem neste país é absolutamente vergonhosa. Como é a dos bombeiros, por exemplo, mas esses já são outros quinhentos....

 

Assistimos progressivamente à triste inversão de prioridades e de privilégios laborais. À insistente valorização das profissões e dos profissionais que geram e que gerem riqueza, em deferimento daqueles que gerem e que protegem a vida. A nossa vida. 

 

Tudo para dizer que é importante assumirmos a luta da enfermagem como nossa. Porque o é, efectivamente.

Os direitos dos enfermeiros não são só os direitos dos enfermeiros. São o respeito, a valorização e a aposta na saúde pública.

E enquanto não pensarmos assim, não sairemos da cepa torta. 

 

3 comentários

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    Anónimo 13.09.2017 21:01

    Imagine que é enfermeiro e que vai administrar um antibiótico a um doente (previamente prescrito por um médico). Como é um enfermeiro extremamente competente explica sempre ao doente o que vai administrar, referindo qual é o antibiótico... eis senão quando o doente lhe diz: " Mas eu sou alérgico a esse antibiótico!!" - "Então e não disse isso ao médico" - "Sim, disse!!"... Vê? É muito simples salvar uma vida ou pelo menos evitar um erro gravíssimo! Também podia estar num dia daqueles com dezenas de doentes na urgência e no meio da correria ou porque outros o estão a chamar ou porque já têm o cérebro feito em água (daquela confusão toda), administrar o antibiótico e não comunicar essa informação doente, porque à partida já está prescrito e devemos confiar na prescrição médica... e pronto! Põe a pata na possa (pelo menos o médico ia ter muitos problema se você não fosse um enfermeiro extremamente competente)...
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    Anónimo 14.09.2017 19:57

    Quem ler esta sequência de comentários vai pensar que os enfermeiros andam sempre a corrigir os erros dos médicos. Qualquer pessoa que trabalhe em saúde sabe perfeitamente que somos uma equipa. Não funcionamos uns sem os outros. Não só os médicos "ignoram" os pedidos dos enfermeiros ;) o contrário também acontece. Há bons e maus profissionais em todo o lado e trabalhar numa urgência é tão dificil para um enfermeiro quanto é para um médico. Um enfermeiro dizer que o médico estava "na paz" a dar as suas altas e o ignorou só porque sim claramente não tem noção do sistema de que faz parte e é demasiado centrado em si para se aperceber daquilo que envolve "dar altas calmamente", ver um doente e tomar todas as decisões. É também frequente os doentes dizerem uma coisa a um médico, outra a outro e ainda outra ao enfermeiro... por isso é bem possível que um doente tenha até dito que não tinha nenhuma alergia e depois, quando lhe voltam a perguntar, a resposta ser diferente. É por isso que essas perguntas se voltam a fazer antes da administração de qualquer medicamento. Isso é confirmar. Não é corrigir erros de médicos. Apoio a luta dos enfermeiros e acho que devem ser mais valorizados e melhor pagos mas acho que o caminho é pela sua valorização como profissão e não atacando as outras classes quer em importancia, ordenado, superioridade, gastos com formação (por aqui é melhor não irem...em comparação com internos), etc. Enfim.
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